segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

"...eu vou me lembrar daquela canção que diz..."


Sabe quando do nada nos lembramos de uma música, e ficamos cantarolando-a? Interessante como funcionamos por associação, e transbordamos por todo o corpo, o que temos no coração. A letra desta música fala sobre os benditos encontros entre as pessoas, e nestes últimos dias tenho pensado muito a respeito da ilimitada importância delas nas nossas vidas.
Nunca acreditei que exista alegria em um caminho que é feito sozinho. É imprescindível misturarmo-nos à nossa gente, e com isso ter em mente que podemos ser grandes como Quintana, ao sabermos partilhar o valor e o propósito de uma companhia: “As pessoas não se precisam, elas se completam... não por serem metades, mas por serem inteiras, dispostas a dividir objetivos comuns, alegrias e vida.”
Como em uma colcha de retalhos, com pedaços nem sempre iguais de diferentes tecidos, várias texturas e cores, com características que se misturam, vamos tecendo uma grande coberta que nos aquecerá da solidão nesta vida nem sempre dividida. Bom que todos soubessem que jamais se sente sozinho quem se vê no outro, e faz disto uma composição feliz e equilibrada. Dar o merecido valor a alguém é saber ter-se de volta na mesma proporção, ainda que não pelo outro, mas por você mesmo. Ver-se parte deste alinhavo de pedacinhos, já nos aquece e nos envolve o suficiente.
Em momentos de alegria extrema, sorrir com mais um, ou mais uns, faz a alegria ecoar com mais entusiasmo. Nunca vi alguém saudável querer comemorar algo sozinho. É urgente a necessidade de convocar semelhantes para fazer com este dom o mesmo que fora feito no milagre dos pães: “Multiplicai-vos”. Espalhai-vos, sobretudo no bem. A intenção é o contágio. Façamos do que é sagrado em nós, a nossa maior doação. O motivo pleno é a extensão infinita da forte aliança que deve haver entre nós mesmos. Ser parte, continua sendo calor e sentimento.
Para tempos de dor, oferecermos as mãos, e vê-las curar é uma mágica divina de sentir. A felicidade premia com amparo os que buscam amontoar-se em períodos difíceis. Há pessoas que por alguma razão de injustificadas razões, escolhem o inverso, e destroem corpos e espíritos, mas ainda assim não há renovação maior nos nossos corações do que a fé, seguida de gente com o seu toque, a energia dos olhares e o conforto da presença. Gosto de lembrar Guimarães Rosa que me faz não esquecer que O mais importante e bonito do mundo é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas, mas que elas vão sempre mudando, afinam ou desafinam, verdade maior. É o que a vida me ensinou” Em cada esquina, um cruzamento oferece um novo caminho. Deus nos permita ter sabedoria para seguirmos escolhendo contínuamente o que melhor nos traçar.
Além disto, é sempre tempo de encontrar. Os acasos proporcionam descobertas de novos sorrisos e ombros, a cada novo ganho, ou perda. Estamos tão interligados que não é surpresa sabermos de um parentesco novo com um toque antigo, e a cada tempo ido, sentimos saudades das pessoas que não temos ao alcance rápido dos olhos. Ao longo da vida, vamos construindo um acervo incalculável de nomes, encontros e lembranças, e este será certamente o maior tesouro de um homem. Imortalizada esta riqueza no nosso coração, teremos recursos para uma vida inteira de recompensas. TER com QUEM dividir, somar ou subtrair o melhor e o pior de nós, é sabermo-nos queridos e não precificados, e esta é a maior vitória que deveríamos almejar.
Vivemos para buscar a unicidade, mas sabemos que nem sempre é possível a conciliação entre todos que somos. Claro que entre as flores das estações e as estrelas dos tempos, teremos os percalços, os ajustes, as decepções, os desencontros e desacatos, as mágoas seguidas de lágrimas, de algumas decisões e dos afastamentos, afinal somos dinâmicos demais para ser previstos em um aprendizado de contexto único. Tendenciono para uma direção, e a elegi como norte, mas muitas vezes me desfaço, me perco, me refaço e então neste passo, descubro que o sentido é mesmo um só, fortalecer-nos entre dúvidas e sonhos. Peço a Deus docilidade para assimilar o que disse a atriz Audrey Hepburn, Embaixatriz da UNICEF ao final da vida. Que colocando em prática o seu sábio conselho, eu entenda que “as pessoas, muito mais que coisas, devem ser restauradas, revividas, resgatadas e redimidas: jamais jogue alguém fora.” Devo também me esforçar para saber que àquelas mais difíceis e que me magoam repetidamente “não sabem o que fazem”. Não as quero nenhum mal, mas não as sei ter por perto sem me deixar doer. Desejo um dia conseguir perdoá-las, enquanto conheço o seu universo, estando leve como a sugestão do Pessoa: Como é por dentro outra pessoa, quem é que o saberá sonhar? Nada sabemos da alma, senão da nossa...”
Interessante que não há nada mais óbvio do que a nossa semelhança, e entre olhos, narizes e bocas, em corpos tão iguais, possamos ser tão diferentes. Cada limite, ou falta de, nos registra em um plano de afinidades, onde encontramos vários de nós no mesmo passo. Nada é impossível para subirmos ou descermos nesta caminhada.  Impossível seria não citar a minha sábia e irrequieta Clarice quando ela há muito já soube dizer o que sinto agora... “O que verdadeiramente somos é aquilo que o impossível cria em nós. uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para a frente. Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita foi a criadora de minha própria vida.”
Seguir com esta consciência liberta-nos de um amanhã pesado. É exercício para ir perdoando, ajustando, conhecendo os nossos, sendo eles quem forem, irmãos, filhos ou amigos. Não é para estancarmo-nos na infelicidade de uma dor ou de um desencontro que alguém nos provoca. “Apesar de”, este é um bom motivo para darmos um passo largo, levando daquele chão apenas a lição. Não suporto ruminar experiências. Elas são para serem vividas, e só. A partir delas, é que somos nós. Além delas, é que existimos. Melhor concentrarmos tudo neste ponto. Em quem nos tornamos, como somos ou reagimos, construímos e regamos as nossas relações. Sempre poderemos melhorar.
Assim, agradecendo, reconhecendo o valor de ser pessoa, de tê-las tantas, tantas boas delas, na minha vida, e plantando a paz que desejo no meu coração, me confesso, enquanto me convido a continuar vivendo feliz, grata, entre muitos, inspirada nas lições Lispectorianas, as quais me alegram o espírito e me renovam os limites certas vezes reduzindo-os, mas que felizmente na maioria delas me faz extrapolá-los.

“(...) farei o possível para não amar demais as pessoas, sobretudo por causa das pessoas. Às vezes o amor que se dá pesa, quase como uma responsabilidade na pessoa que o recebe. Eu tenho essa tendência geral para exagerar, e resolvi tentar não exigir dos outros senão o mínimo. É uma forma de paz. Quem me acompanha que me acompanhe: a caminhada é longa, é sofrida, mas é vivida.


Mona.
Crato, Fevereiro de 2012.

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